“Uma vida acaba, mas uma biografia permanece aberta. Novos fatos sempre aparecem” – É o que explica o biógrafo norte-americano Benjamin Moser, homem por trás das quase 700 páginas de Clarice, (leia-se Clarice vírgula).
Obra que tenta flagrar a história de uma autora que se preocupava mais com a inquietação dos personagens que com suas trajetórias. Lançado nos Estados Unidos em agosto, o livro chega agora ao Brasil. E em novembro passado teve sua noite de autógrafo em Recife.
Entre as histórias coletadas – nos cinco anos de pesquisa e inúmeras viagens para completar a obra –, o estupro que a mãe de Clarice sofreu antes de vir para o Brasil, principal revelação do livro. “A fonte que revelou o estupro foi a própria Clarice, que confiou isso a uma amiga íntima no final da vida. Essa amiga eu conheci no Canadá. Depois, tive que fazer muitíssima pesquisa para confirmar essa história, porque é uma coisa tão horrorosa e tão delicada. Essa era a ideia, aliás, dos que a atacaram: de que não só foi um ataque físico, mas sobretudo um ataque moral, um ato de terrorismo, que deixou traços muito mais profundos. Havia na família uma vergonha imensa ao redor disso”, revela.
Para o biógrafo, o estupro da mãe foi a gênese da literatura. “Ela foi gerada para salvar a mãe, que contraiu sífilis nesse estupro, mas não conseguiu salvar”. O trauma talvez explique sua insistência em se afirmar brasileira. “A minha terra não me marcou em nada, a não ser pela herança sanguínea. Eu nunca pisei na Rússia”.
Para escrever a obra, Moser realizou uma peregrinação: viajou da Podólia (região da Ucrânia onde a escritora e sua família enfrentaram a miséria e a perseguição) ao célebre apartamento no Leme, passando pela ruas do bairro da Boa Vista, em Recife-PE.
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